Protagonistas na libertária Primavera Árabe e parceiras de todas as ocupações de indignados em 2011, as redes sociais também descortinaram a xenofobia reprimida na sociedade e compartilharam linchamentos.
Imagem simbólica dos protestos da Primavera
Árabe: a Praça Tahir, no Cairo, capital do Egito
Ao cabo de outro ano que se vai, como sempre mais digital que o anterior, é o caso de se perguntar: afinal, a web é um caminho para a construção ou a desconstrução dos direitos humanos?
A ânsia de liberdade parece ser um princípio próprio das redes sociais.
Alguns puristas teimam em dizer que as revoluções jamais serão tuitadas. Na dúvida, o poder tem na censura o primeiro de seus instrumentos de contenção, como se viu no Egito de Mubarak.
E até mesmo os ingleses, tão ciosos da tradição secular de uma democracia liberal, pensaram em formas de controlar os sistemas de envio de mensagens, após os conflitos de rua.
A web dá voz a quem tradicionalmente não tem e isso às vezes pode revelar lados sombrios até então adormecidos.
Mais, facilita o comportamento de multidões, quando a racionalidade não é propriamente a primeira conselheira. O que mais poderia explicar centenas de posts pugnando pela pena de morte de forma cruel à enfermeira que matou a pauladas seu cão, ou as mensagens que denunciavam seu endereço e telefone, expondo-a a vingadores menos virtuais?
Mas dar voz a quem não tem é justamente o que faz diferença na questão da comunicação.
Concentrada como nunca, a informação da grande mídia tem lado, partido e ideologia. Só a web é capaz de pulverizar eficazmente a comunicação, sem o quê a democracia se mostra cada vez mais fragilizada e distante.
Críticos não se cansam de alertar para os perigos da Internet, mas quem é capaz de crer que a pedofilia, por exemplo, seja maior dentro do que fora do mundo dos computadores?
Uma avalanche de informações sem controle pode sugerir enorme dificuldade na pesquisa. Mas isso também está longe de causar problemas apenas na rede: quem pode confiar cegamente na informação que lê hoje de uma revista semanal?
Aprender a conhecer os perigos e as fragilidades da informação é essencial dentro ou fora da web. Mas a novidade é que vai se tornando cada vez menos possível informar-se completamente offline.
O recente lançamento "A Privataria Tucana", trazendo denúncias de ilícitos cometidos nas privatizações, foi praticamente escondido pela grande mídia, costumeiramente ávida por escândalos que derrubam políticos.
Até as listas dos mais vendidos passaram a ter sua credibilidade questionada nas redes sociais, em face das omissões seletivas.
Há perigos na mídia pela web, mas serão tão graves quanto o escândalo que marcou o jornal do magnata Murdoch, na Inglaterra?
As redes sociais são democráticas por essência, permitindo a cada cidadão transformar-se ele mesmo em um meio de comunicação de massa.
Mas, como se sabe, a democracia está longe de se resumir a quantidades - assim, jamais abrangeria a carnificina das minorias.
É preciso sedimentar a internet como um espaço em que a liberdade supere o controle e permitir que se mantenha fiel aos princípios que representam a sua própria razão de existir: inclusão e solidariedade.
Mas, demasiadamente humana, a web será, sobretudo, o que fizermos dela a cada dia.
(*) Marcelo Semer é Juiz de Direito em São Paulo. Foi presidente da Associação Juízes para a Democracia. Coordenador de "Direitos Humanos: essência do Direito do Trabalho" (LTr) e autor de "Crime Impossível" (Malheiros) e do romance "Certas Canções" (7 Letras). Responsável pelo Blog Sem Juízo.
Fonte: Terra Magazine, em 04/01/2012
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