Tom Standage, editor digital da The Economist, acredita que
publicações compradas em bancas vão desaparecer. “Mas ainda vai levar
muito tempo, e sobreviverão publicações como revistas de arquitetura”,
diz no bar do Hotel Unique, em São Paulo. Standage foi um dos
palestrantes da conferência Brazil in 2022: Ordem e Progresso, realizada
pela revista britânica na capital paulista nos dias 3 e 4 de novembro.
Com tiragem de 1,5 milhão e 70 correspondentes, a revista britânica, com
a qual CartaCapital tem um acordo editorial, é a publicação global por
excelência. Entre os palestrantes, vários nativos de calibre
questionável, Standage era a exceção como se verá abaixo.
CartaCapital: De acordo com pesquisa realizada nos EUA pelo
Pew Research Center em 2010, 46% dos norte-americanos buscam notícias na
internet. Cerca de 40% das pessoas ainda compram jornais. Por que os
jornais americanos são os que mais sofrem?
Tom Standage: Porque são os que mais dependem de
anúncios. Em 2008, quando estavam no pico, recebiam 87% da sua receita
de anúncios e 13%, de sua tiragem. Isso significa que eram os mais
vulneráveis do mundo a qualquer contratempo econômico.
CC: Cerca de 80% das pessoas nos EUA preferem fontes
tradicionais online, como os websites do New York Times e da CNN. Marcas
ainda são importantes?
TS: Sim, mas as marcas dos veículos de comunicação
têm de ser fortes. No mundo- da internet há muito barulho. Há
internautas dispostos a peneirar sites, blogues etc., para escolher suas
fontes. Contudo, marcas também levam as pessoas àquilo que elas
enxergam como fontes seguras. Por exemplo, a Economist sempre considerou
que seu trabalho é examinar os acontecimentos e filtrá-los para os
leitores. Oferecemos, via revista impressa e online, e de maneira de
fácil consumo, aquilo que você deveria estar refletindo. Para muitos,
somos a fonte principal.
CC: Mas, nessa cacofonia, vocês são uma voz liberal, no
sentido econômico, e há muitas outras vozes. A Economist não poderia se
perder na blogosfera?
TS: Claro, nem todos os leitores da Economist
concordam com nossas posições. Mas você não precisa concordar. O
importante é que sejamos transparentes. Temos de ser consistentes com
nossas ideias nos textos da revista e do website. Sejam os leitores
contrários ou favoráveis às nossas posições, somos formadores de
opinião. Essa é a nossa proposta. Outro dia, alguém de uma ONG nos disse
que a nossa cobertura da África é muito boa.
CC: É mais importante oferecer conteúdo ou estar ciente dos gostos da audiência?
TS: Se você produz um conteúdo interessante, as
pessoas, claro, compram a revista ou voltam para o site. Mas você
precisa das duas coisas. É preciso otimizar o motor de pesquisa para que
os internautas tenham fácil acesso aos seus artigos. E você estará
perdido se não usar a mídia social com habilidade.
CC: Prefere usar Twitter ou Facebook para promover a Economist?
TS: Os dois. Um colega de Oxford disse bem: “O
Facebook é onde está a audiência, mas o Twitter é onde está a notícia”. O
Facebook é para todos. Minha mãe está no Facebook, mas nunca usará o
Twitter. É muito complicado. Mas adoro o Twitter, porque sou um viciado
em notícias.
CC: Falamos sobre a migração dos norte-americanos da mídia
impressa para sites de informações. Não abordamos, contudo, os motivos,
nos EUA, que levaram tanta gente a abandonar jornais. E em certos países
emergentes isso ainda não aconteceu.
TS: De forma geral, a notícia virou uma commodity,
um produto básico, oferecido em bloco e de graça. Nos EUA, jornais
regionais tinham um monopólio sobre agências de notícias. E assim
reproduziam notícias da Reuters e da Associated Press para seus
leitores. Com a chegada da internet, as pessoas perderam o interesse nos
periódicos regionais. Passaram a ler as notícias do dia a dia na
internet. Por que, decidiram, deixar de ler o New York Times online?
Isso não era possível uns 15 anos atrás. Esse fenômeno é negativo e ao
mesmo tempo positivo. Alguns jornais regionais faziam um bom trabalho de
apuração que ia além das informações das agências de notícias. Por
outro lado, outros, como já disse, publicavam somente as notícias das
agências. Nesse último caso, tenho de ser honesto: não foi terrível o
naufrágio desses jornais. Da mesma forma, os anunciantes, antes a
anunciar em jornais e rádios, descobriram a internet como alternativa.
CC: Acha que nos países emergentes haverá essa migração de leitores e anunciantes para sites?
TS: Enquanto as tiragens de periódicos decrescem em
países europeus e nos EUA, jornais em mercados como os da Índia e China
continuam a ter tiragens elevadas, devido a uma série de motivos.
Crescimento econômico, número crescente de pessoas alfabetizadas – e
poucas pessoas com acesso à banda larga. O Brasil é um caso
interessante, porque está exatamente no meio dessas duas categorias, ou
seja, entre os países desenvolvidos e os emergentes. Na última década,
houve um acréscimo na tiragem de diários e revistas no Brasil, mas,
entre 2008 e 2009, essa ascensão chegou a um patamar elevado e começou a
decrescer. Ao mesmo tempo, aqui há um razoável acesso à banda larga,
algo como 23%. É difícil avaliar se esse quadro reflete uma economia que
já não cresce como antes ou se a banda larga no Brasil deixou os
jornais para trás. Poderia ser uma mescla das duas coisas.
CC: Para diários como o The Guardian, o investimento online é
uma questão de vida ou morte. O diário tem uma tiragem de menos de 300
mil exemplares, mas seu site é acessado por mais de 30 milhões de
pessoas ao mês. Como pode o Guardian monetizar seus leitores online?
TS: Não existe um modelo, mas vários. E lembre-se
que o Guardian é subsidiado por publicações lucrativas do mesmo grupo.
Mesmo assim, esse diário é um caso interessante porque oferece todo seu
conteúdo gratuitamente. O fato de ele ser publicado em inglês é atraente
para uma audiência global. Isso não poderia acontecer, por exemplo, com
um diário alemão. Acredito que o Guardian poderia pôr um fim na sua
versão impressa. Nesse caso, teria de triplicar sua receita no exterior
para a versão online. Ao mesmo tempo, eles terão de fazer cortes. Por
exemplo, o Guardian tem 800 correspondentes. Dentro de cinco a dez anos,
esse número deveria ser reduzido pela metade. Mas se existe uma
publicação online que poderá viver de anúncios é o Guardian.
CC: Há esperança para o diário de papel?
TS: Creio que ele vai morrer, mas vai levar muito
mais tempo do que pensamos. Muita gente ainda quer ler revistas e
jornais que assinam ou compram nas bancas. E há nichos. Revistas de
arquitetura, por exemplo, que custam 20 dólares a edição, são mais
interessantes de manusear do que vê-las na tela de um computador. Além
disso, você pode colocá-las na mesa de uma sala. São objetos de arte.
Fonte: Carta Capital, em 08/11/2011
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