Téo Cordeiro*
É difícil supor que o patriarca Roberto Marinho aprovaria a guinada
proporcionada por seus filhos e anunciada explicitamente na noite do dia
10 de dezembro, no Aterro do Flamengo, reunindo 200 mil pessoas em nome
de Jesus Cristo – o “vivo”, não o “morto”, como se referem alguns
evangélicos ao Jesus católico. Ao promover o maior evento musical gospel
da história da cidade, o festival “Promessas”, com a participação dos
nomes consagrados neste estilo, a Rede Globo, comandada pelos filhos de
Roberto, anuncia para a sociedade sua mais nova estratégia: alcançar as
camadas populares cada vez mais vinculadas ao “neopentecostalismo”.
Foram-se os tempos daquele doutor Roberto intransigente à abertura da
emissora para transmissão de expressões religiosas que extrapolassem a
tradição católica apostólica romana de pele branca e olhos claros. A
Missa do Galo ou a cobertura da festa a Nossa Senhora da Aparecida aos
poucos darão espaço às orações de algum bispo, preferencialmente que
tenha um tom conciliador e ecumênico, para a transição se dar de forma
lenta e gradual. Os filhos de Roberto sabem como ninguém da tendência
quase irreversível do Brasil se tornar um país de maioria evangélica,
ultrapassando os fiéis católicos. Então, nada como um megaevento para
abrir as portas e os salões para o novo público evangélico.
E realmente conseguiram dar destaque ao evento com tomadas ao vivo e
entrevistas diretas do Aterro, preparação do trânsito, melhores formas
de transporte, reportagens, e culminando com a gravação de um programa
televisivo, intitulado Festival Promessas, já transmitido em
horário nobre no domingo (18/12). Os irmãos Marinho, mesmo com o evento,
terão um caminho árduo para prosseguir. Tentarão reconstruir uma imagem
da emissora abalada devido às inúmeras repercussões sobre casos de
lavagem de dinheiro, sonegação de impostos e outras estripulias do
senhor todo poderoso do Rio de Janeiro, o bispo Edir Macedo, que junto
ao segundo todo poderoso, o bispo-senador Marcelo Crivella, solidifica
cada vez mais seu apoio a gestão petista de Dilma Rousseff. Os
espectadores mais assíduos e atentos da emissora da família Marinho
puderam notar a diluição das notícias antievangélicas nos noticiários.
As verdadeiras “promessas”
Se já não bastasse, ainda precisarão enfrentar a preferida dos
evangélicos, a Rede Record, que conta com financiamento da publicidade
adicionada aos volumosos apoios de dizimistas ungidos. Tal emissora
conseguiu quebrar tabus inimagináveis, como a transmissão das Olimpíadas
de Londres, e jogará duro na disputa pela transmissão da Copa de 2014 e
Olimpíadas 2016. Nessa disputa, tem sido nítido e quase constrangedor o
apoio incondicional da família Marinho aos governos de Sérgio Cabral e
Eduardo Paes – vide a cobertura completa exclusiva das ocupações das
UPPs e anúncios frequentes, com a expectativa de benefícios presentes e
futuros.
São aguardados, então, novos capítulos rumo à flexibilização religiosa
global, orando e rezando juntos em missa ecumênica, em prol do alcance
de novos públicos, novos nichos de audiências, novas publicidades que
deem condições de garantir a manutenção da própria emissora e sua
exclusividade na formação de opinião de milhões de brasileiros, que vem
sendo perdida a cada ano com o crescimento da emissora liderada por Edir
Macedo.
Enganam-se porém, aqueles que apostam em uma polaridade de propósitos
das duas redes quando nos referimos ao modelo e conteúdo das suas
programações. Ambas caminharão juntas no processo de rebaixamento da
qualidade dos programas com a erotização das relações humanas, a
banalização da violência como um fenômeno meramente espetacular, a
criminalização de expressões de contestação social, mas, sobretudo,
serão uníssonas contra qualquer iniciativa de revisão ou avaliação das
concessões públicas emitidas pelo Estado brasileiro. Estas, sim, são as
verdadeiras “promessas”.
(*) Téo Cordeiro é professor, Rio de Janeiro, RJ
Fonte: Observatório da Imprensa, em 27/12/2011
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