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segunda-feira, 25 de julho de 2011

Maconha: crime de quem e para quem?

Rodolpho Motta Lima*

Nos últimos artigos aqui publicados, tenho manifestado minha inquietude com o fato de que, em nosso país, todos os assuntos, por mais abrangentes que sejam, por mais sérios que se revelem, acabam caindo na vala comum do partidarismo político, o que, não raramente, termina inviabilizando a correta discussão dos temas e, em consequência, a execução de medidas que interessem à maioria dos brasileiros.

Nas eleições, isso aconteceu com a discussão sobre o aborto, em que a mídia apoiadora do Serra quis usar o tema contra a Dilma; recentemente, isso também ocorreu com a questão do livro do MEC, ou com a questão do combate à homofobia, em que, nitidamente, o que se pretendeu foi obter dividendos políticos de oposição ao governo.

É a esse propósito que trago aqui, para discussão, a questão da descriminalização da maconha, que está sendo colocada em relevo, entre outras razões, pela participação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que a ela se manifesta favorável .

Fernando Henrique Cardoso não merece a minha admiração no campo político, talvez até porque a tenha obtido em tempos outros, nos quais o sociólogo defendia as mesmas ideias que hoje continuo defendendo , mas que ele, por certas conveniências e comodidades, esqueceu e mandou que esquecessem...

Mas o assunto da descriminalização da maconha transcende posicionamentos político-partidários e, nesse caso específico, creio que está correta a proposição de uma ampla discussão do tema pela sociedade.

Repudio as drogas e não considero defensáveis as razões que muitos buscam para justificar a sua presença crescente na sociedade. Abomino os que enriquecem com elas e lamento por aqueles usuários que, desinformados e manipulados, se tornam dominados pelo vício. Esse lamentar não se estende, porém, a uns tantos endinheirados da classe média/alta, que, por puro hedonismo e desfrute, acabam entrando nesse mundo. E talvez por isso eu considere que a descriminalização possa vir a ser implementada: em uma sociedade de castas como a nossa, o uso da droga só é crime para quem não tem dinheiro, ou seja, apenas são punidos pela lei os que não têm poder econômico para passar por cima dela.

Como professor, tenho podido testemunhar, com grande pesar, muitos casos de envolvimento dos jovens com drogas, esses jovens que, em uma família desleixada ou desatenta e em uma sociedade permissiva, acreditam que o sucesso vem com as “viagens” feitas com a droga. Já vi muitas potencialidades se perderem nesses caminhos do vício...

No entanto, o certo é que a forma de combater esse problema não é a que vem sendo posta em prática pelas autoridades governamentais ou por outros setores sociais. As medidas de repressão, mesmo quando são executadas para valer (o que, geralmente, não acontece, por certas “cumplicidades” que todos conhecemos) , não atingem os seus objetivos de diminuição do tráfico. E, fundamentalmente, não afastam os usuários das drogas.

Não há outro jeito de minimizar as drogas na sociedade senão a partir de um processo de educação, nas escolas e fora delas. É preciso que, seriamente, se desenvolvam campanhas de esclarecimento quanto aos malefícios das drogas – a maconha entre elas -, como se fez, por exemplo, com o cigarro. É inegável que o combate institucional ao fumo deu resultados e , hoje, a sociedade como um todo já se posiciona claramente contra .

Substituir a criminalização pelo processo educativo é, parece-me, a única estrada a trilhar se queremos minimizar o uso da droga e impedir a sua crescente disseminação na sociedade, sob formas mais perversas ainda, como estamos vendo acontecer com o crack e o oxi.

Dizem os entendidos que a maconha não traz os males que outras drogas provocam à saúde. Pode ser. Parece-me, porém, que o processo de sua descriminalização – que , em princípio, defendo – tem que ser acompanhado de outras providências para que não provoque, pela “tendência ao proibido”, uma corrida a outras drogas mais pesadas e letais.

De qualquer forma, não dá para fingir que não estamos vendo. Não dá para fechar os olhos a esse processo de alienação que as drogas provocam , como fuga à realidade e acomodação. Um certo “pão e circo” que imobiliza tantos jovens, para lucros e conveniências de outros não tão jovens assim...

Acho que temos que discutir sobre a quem incriminar nesse processo. Para mim, é óbvio que não se podem eximir de crime os fornecedores, os que movimentam somas astronômicas com o tráfico e lucram com a infelicidade alheia. Esse assunto tem que vir expressivamente à tona e, quem sabe, tudo possa redundar em um grande plebiscito nacional, fórmula que, cada vez mais, a julgar pela falta de representatividade dos nossos legisladores, considero a ideal para a busca das grandes soluções que o país exige.

(*) Rodolpho Motta Lima é advogado formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil) e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasil.

Fonte: Direto da Redação, em 23/07/2011